Depois de décadas com filmes de ficção científica que tentaram mostrar os perigos da inteligência artificial como um caminho sem fim para o extermínio da humanidade, o século XXI começa a lançar um olhar diferente ao tema. É uma nova abordagem, mas revela perigos muito mais silenciosos da tecnologia.
Sai de cena a figura de Arnold Schwarzenegger como um androide mandado do futuro para matar John Connor, e entram no lugar as mídias sociais, recomendações algorítmicas e outra forma de inteligência artificial. E isso tudo é bem demonstrado em dois documentários que estrearam no fim de janeiro, na última edição do Festival de Sundance.
O primeiro deles é o The Social Dilemma, focado em compreender o papel das redes sociais em nos tornar cada vez mais viciados nelas mesmas. Com algoritmos que aprendem sobre nossa psicologia através do nosso comportamento nos feeds, o documentário mostra como essa tecnologia está sendo cada vez mais aperfeiçoada para nos explorar constantemente por meio de sites e apps.
Fugindo do formato tradicional de documentários, The Social Dilemma apresenta uma narrativa com atores para ajudar a demonstrar os riscos do consumo de redes sociais. Além de uma família de cinco pessoas, que lida com a tecnologia no seu dia a dia, The Social Dilemma personifica três algoritmos — engajamento, crescimento e publicidade —, na imagem do ator Vincent Kartheiser, de Mad Men.
“Nós nos deparamos com todas essas histórias de pessoas que foram radicalizadas online, ou meninas que cometeram suicídio ou tentaram se suicidar por causa de coisas que aconteceram online”, disse Vicki Curtis, um dos roteiristas do documentário. “Queríamos encontrar uma maneira de levar para o filme todas essas histórias pessoais e as mágoas que dividiram as famílias.”
The Social Dilemma termina de maneira relativamente positiva, apesar do olhar receoso que oferece às mídias sociais. Enquanto os créditos sobem, os especialistas ouvidos no documentário apresentam medidas simples que podem ser tomadas por qualquer pessoa para ajudar a ter maior controle de suas vidas em uma sociedade extremamente conectada.
Já o segundo documentário analisa como os apps com reconhecimento facial costumam ser falhos e, em muitos casos, racistas. Coded Bias apresenta a pesquisadora do MIT Media Lab Joy Buolamwini, que diz que o principal problema em sistemas automatizados está na maneira como eles são programados.
A pesquisadora apresenta um sistema de reconhecimento facial que não conseguiu identificá-la por ser negra, obrigando-a a utilizar uma máscara branca. A partir disso, o documentário acompanha Buolamwini até o Congresso, quando ela questiona como tais tecnologias podem ser aceitas para tomar decisões importantes que afetam a vida de milhões de pessoas.
A situação se torna tão incômoda que Jim Jordan, um representante republicano conservador de Ohio, se mostra espantado com a maneira como o reconhecimento facial em apps é apresentado para ele. Em determinado momento, ele chama a tecnologia de “um cenário de George Orwell de 1984 que acho que incomoda a todos nós”. A diretora Shalini Kantayya disse ainda que percebeu “a seriedade de que isso não se tratava de esquerda e direita”.
Porém, a conclusão de Coded Bias é um pouco mais provocativa do que a exibida em The Social Dilemma. Apesar de também contar com algumas possíveis soluções, Kantayya opta por encerrar o documentário com uma voz feminina e em tom calmo, semelhante à de assistentes pessoais como Alexa, Google Assistant e Siri, que fala: “Eu digo, confie em mim. O que poderia dar errado?”.
Fonte: Tecmundo